No dia 21 de Fevereiro de 2013, o cinema Londres fechou as suas portas. As razões apontadas deveram-se à falta de pagamento das contas, como por exemplo a da electricidade. Mas a verdade é que o grupo a que o mesmo pertencia a Socorama estava em processo de insolvência e o futuro desta sala de cinema ia ser negro
O encerramento desta sala de cinema representou o fim de uma época para muitos cinéfilos alfacinhas. De todas as salas que existiam na década de 70, esta era a única que na altura, com excepção do Cinebolso, continuava a ter uma carreira comercial. As poucas que ainda têm as portas abertas, como por exemplo o São Jorge e o Nimas, têm tido nos últimos anos uma programação especial, entre festivais e ciclos, que felizmente as vai mantendo vivas.
Inaugurado no dia 20 de Janeiro de 1972 com o filme MORRER DE AMAR de André Cayatte, o Londres, que era explorado pelo grupo Filmes Castello Lopes, foi apelidado na época da “mais luxuosa sala-estúdio de Lisboa”, fama essa que durou muitos anos. Com uma programação cuidada, vocacionada para o cinema de qualidade e de autor, o Londres depressa conquistou os cinéfilos de Lisboa, cuja presença garantia a exibição prolongada de muitos dos filmes que por lá passaram. Para terem uma ideia, aqui ficam os títulos dos filmes que estrearam no seu primeiro ano de existência: TRISTANA - AMOR PERVERSO de Luís Buñuel, VIVER A SUA VIDA de Jean-Luc Godard, MELODY de Waris Hussein, MARIA WALEWSKA de Clarence Brown com Greta Garbo (a primeira das poucas reposições que tiverem lugar neste cinema), O BAILE DOS BOMBEIROS de Milos Forman, O BOY FRIEND de Ken Russell, DUAS INGLESAS E O CONTINENTE de François Truffaut e CABARET de Bob Fosse (que atingiu os 100.000 espectadores aquando da sua longa carreira neste cinema).
Muito antes de ir ao Londres, já tinha ouvido falar das suas super-cadeiras, que deslizavam quando nós nos sentávamos, pregando sustos a muita boa gente, pois pensavam que estas se estavam a partir. Experimentei-as pela primeira vez no dia 26 de Abril de 1976. Tinha 11 anos e consegui convencer os meus pais a levarem-me a ver O FANTASMA DO PARAÍSO do Brian DePalma. Adorei as cadeiras, mas achei o filme um bocado histérico de mais para o meu gosto e odiei a música do mesmo. Só voltei ao Londres cerca de um ano depois, em 1977, para ver o divertido A ÚLTIMA LOUCURA de Mel Brooks, onde quase ia morrendo com falta de ar de tanto rir. A este seguiu-se a reposição de VAMO-NOS AMAR com a Marilyn Monroe, que também fui ver.
Nessa altura não frequentava muito o cinema e, na verdade, a sua programação não era muito atractiva para um puto da minha idade. Assim, só lá voltei em 1980 para ver um novo musical de Stanley Donnen chamado de FITAS LOUCAS. Mas em 1981, ano em que fiz 17 anos, consegui a proeza de ver todos os filmes que lá estrearam: ESQUECER VENEZA de Franco Brusati, O ÚLTIMO METRO de Truffaut, A CIDADE DAS MULHERES de Federico Fellini, DAS 9 ÀS 5 de Colin Higgins, DA VIDA DAS MARIONETES de Bergman e LILI MARLEEN de Fassbinder. A partir dessa altura, ir ao Londres passou a fazer parte do meu roteiro cinematográfico e vi por lá muito e bom cinema, bem como filmes de menor qualidade.
No princípio dos anos 80, a programação da sala deixa de ser tão selectiva ou, se preferirem, cuidada e filmes mais comerciais começam a estrear por lá, como por exemplo CLASSE, A EXPERIÊNCIA DE FILADÉLFIA, CROCODILO DUNDEE e MALUCOS E LIBERTINOS. O Londres começa não só a perder a sua identidade, como também a exclusividade dos filmes; com o número de salas a crescer em Lisboa, os filmes começam a poder ser vistos em vários cinemas e o público começa a dividir-se. A fim de tentar fazer frente aos complexos de salas dos centro comerciais, o Londres fecha para obras (salvo erro no final dos anos 90) e reabre com duas salas. Mas a sua programação não voltou mais a ser a mesma e, tal como eu, o público foi-se afastando. Mas ainda mostrou muito bom cinema e com sucesso: A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER, SEXO EMNTIRAS E VIDEO, PULP FICTON de Quentin Tarantino, ATA-ME e MULHERES À BEIRA DE UM ATAQUE DE NERVOS de Pedro Almodovas, AS PONTES DE MADISON COUNTY, HENRY & JUNE, O ÚLTIMO IMPERADOR e WALL STREET, entre outros.
Os anos 70 e 80 eram outra coisa, e era possível os cinemas terem a sua própria “personalidade”. Hoje em dia isso já não existe e o público prefere ir a um cinema que tenha muitas salas por onde escolher e, de preferência, que haja muitas lojas em seu redor. São outras maneiras de ver o cinema, tão válidas como as antigas, mas tenho saudades dos velhos cinemas de Lisboa e é uma pena que o Londres tenha fechado as suas portas. É verdade que deixei de frequentar esse cinema, mas era reconfortante saber que ele ainda estava ali. Ainda sonhei que alguém iria reabrir o Londres e devolvê-lo aos aseus tempos de glória; mas não, ao fim de algum tempo de estar encerrado, transformaram-no em mais um aloja dos “chineses”.
Texto © Jorge Tomé Santos / 21.04.2013 5.12.2020
Sem comentários:
Enviar um comentário