quarta-feira, 22 de setembro de 2021

A PROPÓSiTO DO MOTELX

Não me recordo com que idade é que comecei a gostar de cinema, mas não me lembro de nenhuma altura na minha vida em que o cinema não fizesse parte de mim. Depressa me apaixonei por dois géneros específicos, ambos de puro escape, o Musical (culpa das matinés televisas com o Fred Astaire e a Ginger Rogers) e o Terror (a culpa foi dos contos de fadas originais, pré Disney). É sobre este último género que me vou hoje debruçar.

Não tenho a certeza se O FILHO DE DRÁCULA foi o primeiro filme do género que vi, mas é o primeiro de que me recordo de ver na televisão. ABBOTT E COSTELLO E OS MONSTROS, visto em 1975 no cinema Caleidoscópio, tinha então 11 anos, abriu-me a porta do género no cinema e, uns meses depois, vi o meu primeiro filme de terror “adulto” numa sessão da meia-noite, A IMAGEM DO MEDO (A Reflection of Fear) era o seu título e confesso que me meteu mesmo medo.

 

Depressa me tornei um ávido fã do género, vendo todos os filmes que podia. Sem clubes de vídeo nem internet, era aproveitar o que aparecia nos cinemas ou na televisão. Infelizmente o género não tinha grande divulgação por cá e eu “babava-me” a ler a revista “Famous Monsters” e mais tarde a “Fangoria”. Ouvia rumores de que em Paris e noutras cidades existiam salas de cinema especializadas no género e sonhava que um dia existisse uma dessas em Lisboa (o extinto Xenon foi quase isso).

 

Quando em 1981 o Fantasporto nasceu na sua cidade homónia, só me apeteceu mudar.me para lá, mas esse Festival fez, no seu início, algumas curtas visitas a Lisboa e acabei também por ir dois anos de propósito ao Porto para ver filmes de terror. Só que de repente a programação do Fantasporto começou a mudar, com o número de filmes de terror a diminuir e outros géneros a ganharem força. É verdade que o Fantasporto nunca se anunciou como um festival de cinema de terror, mas sim como o Festival Internacional de Cinema do Porto, com um carinho especial pelo cinema fantástico no geral. Talvez percebam melhor o que eu quero dizer, se souberem que, neste ano de 2021, o filme de abertura foi o drama MORTE EM VENEZA de Luchino Visconti e o de encerramento o western NO MAN’S LAND.

 

Claro que a existência do Fantasporto, me fez sonhar que um dia seria possível ter um festival do género em Lisboa e, eis que em 2007, aparece o MOTELX – Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa. Sim, leram bem, Cinema de Terror. Não é fantástico, a designação é mesmo “terror”!

 

Este Festival nasceu a partir do CTLX – Cineclube de Terror de Lisboa, um clube criado em 2005, cuja uma das primeiras sessões (se não mesmo a primeira) teve lugar no extinto Cinema King; onde numa sessão da meia-noite exibiram DOG SOLDIERS de Neil Marshall. Depressa fiquei atento aos seus projectos e mal podia acreditar quando, há 15 anos atrás, anunciaram o nascimento do MOTELX e acreditem que sou frequentador do mesmo desde a primeira edição.

 

Infelizmente, nos últimos anos deste Festival, o cinema de terror anda a ceder demasiado espaço a thrillers, dramas negros e como resultado este ano só fui ver dois filmes. Não há falta de filmes de terror, por isso por que razão se inaugurou a edição deste ano com o THE GREEN KNIGHT? Percebo que seja importante exibir cinema português, mas o que é que os filmes 20,3 PURGATÓRIO e INFERNO têm a ver com o género?

 

Também compreendo que os filmes que concorrem ao Prémio MotelX – Melhor Longa de Terror Europeia / Méliès d’argent, não sejam propriamente de terror. O Golden Méliès for Best European Fantastic Film é, como o nome diz, para cinema fantástico e não exclusivo para cinema de terror.



Não faço a mínima ideia de como se organiza um festival desta envergadura e não tenho dúvidas que deve dar imenso trabalho. Talvez que os responsáveis pela programação não tenham grande hipótese de escolha ou tenham uma percepção diferente da minha do que é o Cinema de Terror. Mas custa-me a acreditar que não fosse possível trazer ao festival mais filmes que fossem mesmo de terror (o novo HALLOWEEN, DEMONIC, ANTLERS, etc). Mas não é só a programação que me têm vido a decepcionar, mas também o sentido de “festa” que o Festival tinha. Sei que a situação do COVID não ajuda, mas onde estão os cartazes dos filmes? Os cenários e os personagens de terror que se encontravam no São Jorge? Espero que os seus organizadores não achem que, agora que o MOTELX é um Festival de prestígio, que este deva perder a loucura salutar que atraiu os fãs e que fez do Festival um sucesso. Nós merecemos um festival tão louco quanto nós! Mas não me interpretem mal, continuo a agradecer do fundo coração a existência do MOTELX!

 

Para terminar, que isto já vai longo, quando era adolescente li um livro chamado “A Pictorial History of Horror”. Nesse o seu autor, Dennis Gifford, afirmava; 

“Para mim, um elemento de fantasia é essencial para um verdadeiro filme de terror: o impossível em vez do improvável. O vampiro, o lobisomem, os mortos-vivos e os monstros criados pelos homens – estes são os heróis do cinema de terror e não os inquilinos, os estripadores e os psicopatas encapuçados”.

Talvez as suas palavras me tenham influenciado, pois concordo quase na totalidade com a sua afirmação e adoro tudo o que tenha a ver com o sobrenatural. Mas ao contrário dele, para mim os psicopatas também fazem parte do género que amo, o Terror. 

 

Bem, espero que para o ano, o Terror volte em força ao MOTELX! Nós os fãs do género aguardamos ansiosamente pelo seu regresso!

 

Texto © Jorge Tomé Santos / 21.09.2021

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